sexta-feira, 10 de novembro de 2017

Montanha Louca: Primeiro Tempo.A Cozinha Um.



Por ser a primeira construção foi batizada como : Cozinha Um. Representava um quase monumento histórico, nela ficariam guardadas as memórias, histórias, reticências, aromas, receitas e confissões. Lá se comentavam os triunfos e agruras de cada habitante, onde toda manhã se contavam os sonhos que haviam sonhado na noite anterior. Naquele tempo bem caberia o título de Cozinha dos Sonhos.
Também por lá transcorreram as apresentações. Quando chegou à minha vez de apresentar me vi que não seria nada fácil ressumir os vinte e cinco anos transcorridos até aquele momento todos aqueles amores países vidas que tinha deixado para trás para me fundir com esta crosta mesozoica, para fazer parte deste corpo, para ser mais um soldado deste exército, uma peça deste quebra-cabeça, uma montanha cobaia um nada e um tudo! Yo Flavia Mariana Klc, nascida 3/3/às tantas horas, filha de Checo-eslovacos (Judeus) com Espanhóis e Italianos do Sul (Mouros) fui uma atriz do grupo do Juan, estudante universitária, comerciante do ramo vitivinícola gerada na Montanha Plateada dos Andes Mendocinos e parida na Metrôpole fedorenta que tem por nome próprio o de Santa Maria de Los Buenos Aires. Enquanto fazia teatro na cidade e aprimorava meus programas para levá-los ao apogeu, uma ideia crescia dentro de mim, seduzida pelas histórias do Juan sobre uma pequena cidade de pedras encantada encravada no topo de uma das Montanhas das Minas Gerais, a ideia cobrava uma forma iria me embrenhar pelas selvas do Brasil ( no fabulário argentino o Brasil era como os filmes do Tarzã) Decidi largar a vida das certeza e embarque rumo à São Paulo com uma mala de livros e outra de roupas que minhas amigas teriam jogado no lixo por medo de doá-las.
Escutei com atenção cada uma das suas histórias, relatos fabulosos, diários mínimos, detalhes destas Vidas como que retiradas do resto do Mundo. Se entendi bem, todos tinham deixado suas antigas propriedades identidades estabilidades nalgum lugar longe ou perto dali, mas que não era ali. Tinham largado tudo para estar aí, nesse momento, para criar o mundo de novo, um novo mundo onde nada de mau poderia acontecer. Nos parâmetros das suas crenças, na medida de suas capacidades, ao abrigo das Candeias e Congonhas e Estrelas do Serrado sem nada e nem ninguém para atrapalhar testemunhar ou interferir, livres para viver todas suas vidas possíveis.
Quando finalmente aquela construção primeira teve sua porta nela escreveram
Você abriu? Feche! Acendeu? Apague! Ligou? Desligue! Esta usando algo? Trate com carinho! É de graça? Não desperdice! Não lhe perguntaram? Não de palpite! Quebrou? Conserte! Não sabe consertar? Chame quem ajude! Não lhe diz respeito? Não se intrometa! Desarrumou? Arrume! Sujou? Limpe! Não veio para ajudar? Não atrapalhe! Ofendeu? Peça desculpas! Seguindo estas regras viverás melhor.
Logo que o Sol saísse completamente, quero dizer o círculo inteiro desenhado no horizonte, tomavam café perto do fogo. As pedras eram brilhantes pareciam piscar de luzes dependendo do ângulo e a hora do dia, era uma atividade intensiva o dia inteiro e também um parlatório, todos traziam suas histórias para contar, uns recolhiam lenha, outros procuravam alimentos, outros os manipulavam. Tanta felicidade e envolvimento começou a chamar àtenção das crianças, que naquele tempo eram "soltas" e começaram a se aproximar como abelhas das flores, espontaneamente.
Um dia o maior deles, o que falava mais, trouxe quatro folhas sulfite datilografadas, um conto:
O dia que Marta Lopes se sentou no meio da Praça; deste conto surgiu A Iluminada um conto maior que eu escrevi. É a minha memória mais antiga.

Um comentário:

  1. Gostei do texto, uma narrativa capaz de estimular nossa imaginação e vislumbrar o que deve ter sido o começo de tudo!

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